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Desova das tartarugas-da-Amazônia tem início no Vale do Guaporé após dois meses de atraso

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Comissão de Meio Ambiente da Alero reforça ações de monitoramento, zoneamento ecológico e proteção das praias utilizadas pelos quelônios para reprodução.

O dia amanhece lento no seio do Vale do Guaporé. O sol se abre sobre as águas e o calor começa a desenhar sombras de vida na areia. A natureza, aqui, não se apressa e as tartarugas-da-Amazônia sabem disso. Após semanas de espera, de silêncios e de noites vazias, o ciclo enfim se cumpre: tem início a desova. Não com o espetáculo apressado que o homem espera, mas com o compasso antigo e natural que só o rio entende.

Durante vários dias, a equipe de reportagem da Assembleia Legislativa de Rondônia (Alero), a pedido da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, acompanhou o início da temporada de desova no Vale do Guaporé. O cenário que se vê é de alívio, mas também de atenção. Nas primeiras semanas, as fêmeas começaram a subir em número menor que o esperado, retomando o ciclo reprodutivo depois de mais de dois meses de atraso.

Tartarugas descansam às margens do Rio Guaporé (Foto: Ecovale)

Foi um começo diferente, discreto, quase tímido. Mas foi o sinal de esperança necessário. Pois na semana seguinte, a natureza, enfim, tocou o despertador, levando as tartarugas a finalizarem o ciclo de desova. O que se observa agora são as praias invadidas por elas, inclusive aquelas que nunca haviam sido utilizadas pelos quelônios.

A desova está oficialmente em curso, espalhando ninhos por toda a extensão do Rio Guaporé, em uma demonstração silenciosa de resistência e continuidade.

Tartarugas fazem ninhos nas praias ao longo do Rio Guaporé (Foto: Ecovale)

O ritual

Durante o dia, elas aparecem em bandos, descansam às margens do rio, sobre as praias que se formam com o nível da água baixando. Elas levantam a cabeça como quem fareja o vento. Parecem ensaiar o momento certo. Quando a lua surge e a beira se cobre de prata, algumas sobem devagar, arrastando o corpo pesado, abrindo o caminho e construindo o ninho com as pequenas patas. Outras observam de longe, como se o instinto ainda medisse o tempo.

E assim, no Vale do Guaporé, na fronteira com a Bolívia, o fenômeno que antes preocupava – atraso na desova – cede lugar à satisfação de ver as tartarugas-da-Amazônia, mais uma vez, seguindo o ciclo da vida no maior quelônio de água doce da América do Sul e um dos símbolos da biodiversidade brasileira.

Biólogo explica a importância do trabalho dos voluntários (Foto: Marcela Bomfim | Secom ALE/RO)

Para José Soares Neto, conhecido como Zeca Lula, um dos fundadores da Associação Comunitária e Ecológica do Vale do Guaporé (Ecovale), o atraso deste ano não é ruptura, é adaptação. “O rio encheu mais tarde, o calor se espalhou diferente, as chuvas se confundiram com o verão, além de vários outros motivos que atrasaram por mais de 70 dias o início da desova das tartarugas. Estamos em alerta para ver como vai ser o comportamento este ano, pois com esse atraso, na época do nascimento das tartarugas, o rio já vai estar mais elevado”, disse. 

Esse comportamento só pode ser verificado com a observação. As fêmeas, sábias e pacientes, esperam o toque exato da natureza antes de iniciar a jornada. Porque o tempo da Amazônia não se mede em calendário, se mede em sinais. E os sinais chegaram.

A rede de proteção

Entre uma noite e outra, pesquisadores, biólogos, ribeirinhos e voluntários percorrem e vigiam as praias. As lanternas recortam o breu, revelando o vai e vem das fêmeas. Algumas já deixaram ninhos recém-feitos. Outras apenas sondam a areia, como se o corpo ainda buscasse a temperatura certa para entregar os ovos à terra.

Zeca explica que é preciso observar o novo comportamento da natureza (Foto: Marcela Bomfim | Secom ALE/RO)

Zeca Lula lembra que já viu muitas temporadas começarem assim, em silêncio e, de repente, a praia fica tomada por cada uma delas. “É o jeito delas”, diz, olhando o rio. “Quando o tempo muda, elas mudam junto. Mas sempre voltam. Sempre. Só temos que esperar para ver como vai ser o nascimento e cada um fazer a sua parte”, afirma.

O trabalho de proteção do qual o ambientalista faz parte começa muito antes da desova e segue até o nascimento dos filhotes. O período de incubação dos ovos dura cerca de dois meses, tempo em que o calor da areia garante o desenvolvimento dos embriões.

Porém, neste ano, o atraso na postura trará um desafio extra: quando os filhotes nascerem, o rio já estará mais cheio e a areia mais compacta, o que pode dificultar a saída das pequenas tartarugas em direção à água.

Por isso, os ambientalistas e órgãos de fiscalização já se mobilizam para formar novas frentes de apoio voluntário durante a fase de nascimento. Será necessário reforçar o número de pessoas para acompanhar o processo e ajudar as tartarugas a romper a superfície, permitindo que sigam seu ciclo natural rumo ao rio.

Tartarugas fazem ninhos nas praias para desova (Foto:  Ecovale)

“A gente não vem só olhar, vem cuidar. Esse processo todo da desova das tartarugas, o período de maturação dos ovos e depois, no momento da eclosão, a gente precisava de muito mais gente para conseguir fazer ser bem efetivo. Ainda mais pelo que aconteceu ano passado e que a gente sabe que vai acontecer esse ano. Morreu demais! Todo mundo ficou com muita dó do que tava acontecendo, mas não conseguia fazer mais”, enfatizou o biólogo Deyvid Muller.

O trabalho é conjunto e envolve a Ecovale, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam), a Polícia Militar Ambiental, empresas parceiras e dezenas de voluntários.

Ninhos feitos pelas tartarugas no início da desova (Foto: Marcela Bomfim | Secom ALE/RO)

São homens e mulheres que dormem pouco e falam baixo, para não assustar as mães. Carregam nas mãos e nos olhos o brilho de quem entende o valor do silêncio da natureza. Eles são as vozes das margens. São sábios que decifram o tempo pelas nuvens, pelo cheiro da água, pelo canto das aves. E é por isso que entendem que o ciclo segue vivo e que necessita de atenção, mesmo quando a ação humana resulta em impactos ao ritmo natural da floresta.

A atuação da Comissão

Atenta a esse cenário, a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Rondônia tem acompanhado as transformações ambientais que afetam o Vale do Guaporé e outros ecossistemas do estado.

Neste ano, a Comissão concentrou esforços na atualização do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico de Rondônia, instrumento essencial para planejar o uso sustentável do território, conciliando o desenvolvimento econômico com a preservação ambiental. Além disso, o zoneamento define as áreas de proteção, manejo e recuperação, e sua atualização tem impacto direto na conservação de regiões como o Guaporé, onde o equilíbrio climático e a proteção das nascentes influenciam diretamente no ciclo das tartarugas-da-Amazônia.

Audiência Pública sobre o zoneamento realizada em Nova Mamoré (Foto: Thyago Lorentz | Secom ALE/RO)

O presidente da Comissão, deputado Ismael Crispin (Sem Partido), destaca que o zoneamento é uma ferramenta indispensável para garantir que Rondônia continue crescendo de forma responsável, sem comprometer o patrimônio natural que sustenta o estado. “O zoneamento é mais que um mapa técnico, é um instrumento de equilíbrio entre o homem e a natureza. Ele mostra até onde podemos avançar e onde precisamos preservar. Quando olhamos para o Vale do Guaporé e vemos as tartarugas desovando, entendemos que proteger esse ciclo é também proteger o futuro de Rondônia”, defendeu o parlamentar.

Comissão do Meio Ambiente da Alero em reunião (Foto: Thyago Lorentz I Secom ALERO)

A Comissão também acompanha ações de monitoramento e fiscalização, além de apoiar iniciativas de educação ambiental e turismo sustentável em comunidades ribeirinhas. Medidas essas que reforçam o compromisso da Assembleia Legislativa com políticas públicas que assegurem a sobrevivência das espécies e a valorização dos recursos naturais do estado, aliando proteção ambiental e desenvolvimento sustentável.

Texto: Ivanete Damasceno | Jornalista Secom ALE/RO
Foto: Marcela Bomfim e Thyago Lorentz | Secom ALE/RO e Ecovale

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