Há fatos que não admitem relativização. Há episódios que não comportam notas protocolares, explicações evasivas ou o velho “nada a declarar”. O caso envolvendo o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e o Banco Master é um deles. Não se trata de fofoca política, intriga de bastidor ou perseguição ideológica. Trata-se de conflito de interesses explícito, grave e institucionalmente inaceitável.
Um ministro da mais alta Corte do país manteve contatos diretos, reiterados e fora de qualquer liturgia republicana com o presidente do Banco Central do Brasil, Gabriel Galípolo, em um momento sensível para decisões que impactavam diretamente um banco privado que, por coincidência — ou não — mantinha contrato milionário com o escritório de advocacia da esposa do próprio ministro.
Se isso não é escândalo, nada mais é.
Não existe interpretação criativa do Direito, hermenêutica progressista ou malabarismo institucional que torne aceitável o seguinte fato: um ministro do STF atuando nos bastidores junto ao chefe da autoridade monetária para tratar de interesses ligados a uma instituição financeira privada conectada à sua esfera familiar.
Mesmo que Moraes alegue que “não falou especificamente do banco”, o argumento não se sustenta. Em ética pública, não importa apenas o conteúdo da conversa — importa o contexto, o momento e a relação de interesses. A simples aproximação já contamina o ato. A insistência, então, o torna indefensável.
Em democracias sérias, isso resultaria em afastamento imediato. No Brasil, tenta-se normalizar.
O episódio expõe algo ainda mais preocupante: a consolidação de um poder que não reconhece limites. Alexandre de Moraes não é apenas um ministro do STF. Tornou-se um ator político central, com influência direta sobre Congresso, Executivo, imprensa e agora — ao que tudo indica — até sobre o sistema financeiro.
Quando um magistrado com esse grau de poder passa a transitar entre o público e o privado sem constrangimento, a separação entre os Poderes deixa de ser princípio constitucional e vira peça decorativa.
O Banco Central é uma autarquia independente. Não responde a ministros do STF. Não recebe orientação política de juízes. Quando esse muro é atravessado, a República sangra.
O que se vê desde a revelação do caso é um silêncio ensurdecedor das instituições que deveriam zelar pela integridade do sistema. Nenhuma explicação detalhada. Nenhuma transparência real. Nenhuma investigação aberta de ofício. Apenas notas frias e evasivas.
Esse silêncio não é prudência. É cumplicidade institucional.
Enquanto isso, o cidadão comum assiste à consolidação da percepção mais corrosiva possível para qualquer democracia: há autoridades que não prestam contas a ninguém.
Não é perseguição. É responsabilidade.
Rotular críticas como “ataques à democracia” já virou expediente conhecido. Mas democracia não é blindagem de poder. Democracia é controle, fiscalização e responsabilidade — sobretudo dos que concentram mais autoridade.
O caso Banco Master não é um detalhe. É um divisor de águas. Ou o Brasil admite que ministros do STF podem agir como lobistas informais de interesses privados ligados à sua família — ou reafirma, com fatos, que ninguém está acima da lei.
Se fosse qualquer outro agente público — um ministro de Estado, um diretor de banco, um parlamentar — o escândalo já teria implodido carreiras. Por que, então, quando o nome é Alexandre de Moraes, exige-se silêncio, cautela infinita e tolerância máxima?
A resposta é simples e assustadora: porque o poder deixou de ter contrapeso.
E quando isso acontece, não é o ministro que está em apuros.
Assista:

Por Emílio Kerber Filho*
Jornalista e escritor
Autor do livro “Por trás das grades – O diário de Anne Brasil”.
*O jornal Correio de Notícia se reserva no direito de manter a opinião dos colunistas/articulistas integralmente, sem intervenções. Entretanto, conteúdo expresso neste artigo é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Correio de Notícia não tem responsabilidade legal pela “OPINIÃO” que é exclusiva do autor.




