As pessoas com deficiência fazem parte de um grupo de pessoas em situação de vulnerabilidade, eis que possuem um histórico de exclusão e violência sistemáticos. Por sua vez, a Defensoria Pública é Instituição que se configura enquanto instrumento do regime democrático e promovedora dos direitos humanos. Uma sociedade se torna democrática na medida em que o sistema jurídico está comprometido com a proteção das liberdades individuais, com os direitos sociais e com as práticas inclusivas. Portanto, é inegável a importância da atuação da Instituição direcionada para a inclusão social de pessoas com deficiência.
O modelo social de deficiência, em vigor tanto em âmbito interno assim como em âmbito internacional, surge em superação ao modelo médico reabilitador. A deficiência passa a ser vista como a resultante da interação entre as características individuais do sujeito mais as barreiras existentes na sociedade que ele está inserido e que atrapalham ou impedem o gozo de seus direitos e deveres com o maior grau de autonomia possível. É o contexto social que gera a exclusão e a solução da situação passa por uma sociedade acessível para todos os seus membros.
Sendo assim, diante das barreiras experienciadas por pessoas com deficiência, a Defensoria Pública atua para a proteção desse grupo de pessoas sempre que restar configurada uma hipótese de vulnerabilidade, independentemente da respectiva situação financeira da pessoa interessada. A Instituição atua no combate ao capacitismo e todas as suas formas de expressão.
Analisando o artigo 4º, inciso XI da LC 80 de 1994 – que menciona expressamente a atuação da Defensoria Pública em favor das pessoas com deficiência e de outros grupos vulneráveis – é possível concluir que a Defensoria Pública funciona como instrumento de superação da violência, da intolerância, da discriminação, da exclusão social e da incapacidade geral de aceitar o diferente. Por tal razão, nessas hipóteses a atuação da Defensoria Pública não está relacionada apenas com a hipossuficiência econômica. Em eventual ação individual de pessoa com deficiência cujo objeto esteja relacionado com a deficiência e grave violação de direitos humanos, o resultado poderá abrir portas para outras pessoas com deficiência, ao menos por conta da criação de um precedente. Ainda que a lide seja individual, ela refere-se a um problema comum de determinado grupo vulnerável, podendo trazer benefícios – de maneira global – para tal grupo.
No tocante à atuação da Defensoria Pública como custos vulnerabilis em favor da pessoa com deficiência, o embasamento jurídico encontra previsão no artigo 79, parágrafo 3º e artigo 98, ambos da Lei Brasileira de Inclusão, que preveem que a Defensoria Pública tomará as medidas necessárias para a efetivação dos direitos das pessoas com deficiência previstos na referida lei, assim como poderá ingressar com demandas judiciais para a proteção de interesses coletivos, difusos, individuais homogêneos e individuais indisponíveis da pessoa com deficiência. Desta feita, em casos judiciais e extrajudiciais que envolvam temas que tragam grandes reflexos a pessoas com deficiência, faz-se indispensável a intervenção institucional da Defensoria Pública na condição de custos vulnerabilis para fiscalizar a efetivação dos direitos constitucionais de tal grupo, uma vez que eventual decisão processual ou extraprocessual poderá gerar profundo impacto na vida de tais indivíduos.
Desta feita, Defensoras e Defensores Públicos atuam diariamente na efetivação dos direitos das pessoas com deficiência, seja em âmbito coletivo ou individual, na seara administrativa ou judicial. A Defensoria Pública é, indiscutivelmente, uma Instituição de instrumentalização do modelo social de deficiência e todos os seus colorários pela implementação de uma sociedade menos capacitista e mais inclusiva.
Por Flávia Albaine
Flávia Albaine é Defensora Pública de Rondônia, ex-coordenadora e atual membra integrante da Comissão de Pessoas com Deficiência da Anadep, Especialista em Direito Privado, professora e pesquisadora –Instagram.com/flaviaalbaine*
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