Um texto publicado pelo jornalista Claudio Dantas, publicado em seu próprio site, clareia a questão do absurdo indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro.
As questões trazidas a baila por Dantas são tão óbvias que desmoralizam a Polícia Federal, que notadamente está instrumentalizada a serviço do sistema.
Vale a pena a leitura. É elucidativa. Transcrevemos:
“Li na diagonal as quase 900 páginas do relatório de indiciamento de Jair Bolsonaro, na expectativa de encontrar evidências de envolvimento do ex-presidente na execução de um golpe de Estado – acusação principal da Polícia Federal. Me interessei especialmente pelos depoimentos dos então comandantes do Exército Freire Gomes e da Aeronáutica Baptista Júnior, apontados pelos investigadores como aqueles que resistiram ao intento golpista do então presidente da República. Diz a PF que Bolsonaro, após finalizar os termos da chamada minuta do golpe, ‘mandou chamar ao Palácio da Alvorada os comandantes’. ‘Os comandantes do Exército e a Aeronáutica se posicionaram contrários a aderir a qualquer plano que impedisse a posse do governo legitimamente eleito’.
Chama atenção que a PF não tenha reproduzido no relatório justamente os depoimentos de militares de alta patente que são considerados peças-chave para o entendimento de todo o plano e da participação de Bolsonaro nele. Chama atenção também que dois comandantes de forças tenham se negado a cumprir uma ordem (ainda que ilegal) do comandante-em-chefe e não tenham sido imediatamente destituídos por ele, ou mesmo que tenham silenciado durante todo o tempo diante do intento golpista.
Outro aspecto notório no documento da PF é o esforço dos investigadores em transformar as tantas críticas ao sistema eleitoral, todas públicas e sistemáticas, num engendramento golpista que teria se iniciado em 2019! Para a PF, Bolsonaro começou o golpe no mesmo ano em que tomou posse. O debate em torno dos limites para aplicação do artigo 142, também público e sistemático, foi obliterado pela narrativa golpista a ponto de não haver sequer uma menção ao artigo 142 ao longo de todo o relatório – com exceção do ‘plano 142’ encontrado numa gaveta da sede do PL. Tampouco há menção ao Estado de Sítio.
A PF também usa e abusa da palavra ‘execução’ como artifício retórico para incluir qualquer ato preparatório, não punível pela legislação, em ato executório. A palavra ‘execução’ é repetida 25 vezes em contextos absolutamente diferentes, como no questionamento sobre a segurança das urnas antes do pleito, na representação feita pelo PL para verificação de supostas falhas na apuração e também na disseminação da tese de fraude via mídia, assim como numa carta de oficiais da ativa ao comandante do Exército. ‘O documento representa uma clara ameaça de atuação armada, deixando evidente que a execução dos atos para suprimir o Estado Democrático de Direito estava em andamento’, alega a PF.
A confusão entre atos preparatórios e execução é proposital. Existe, inclusive, um capítulo do relatório intitulado ‘Da execução das ações formalizadas na reunião do dia 28 de novembro de 2022’. Em outro trecho, a PF reproduz troca de mensagens entre os coronéis Mauro Cid e Correa Neto sobre conversa do então ajudante de ordens com o general Estevam Cals Theophilo, comandante do Coter. ‘E aí, vai ou não vai? // Dia a dia. As coisas estão sendo construídas.//O papo foi bom? Dia a dia vai chegar dia 12 kkkkk// Ainda não acabou. Mas ele quer fazer… desde que o PR assine.’ Na sequência, a PF conclui que ‘o teor dos diálogos evidencia que as medidas para a execução da tentativa de golpe de estado para impedir que o governo legitimamente eleito assumisse e da mesma forma, restringir o exercício do Poder Judiciário, estavam em execução’.
Se tudo é golpe, nada é golpe. Mas todos já estão condenados.”
Fonte: jco*